"When you’ve destroyed something you’ve greatly loved,
you learn to love to destroy" – Gregory Peck em Days of Glory.
De início, uma casa de tijolos batidos, marcada pelo tempo
(pela chuva e pela neve), é habitada por um homem cujo pragmatismo estratégico
a torna imperturbável. Este homem também carrega consigo as marcas do seu
tempo, mas suas cicatrizes são internas. Depois, a ruína da casa acompanha a
ruína do homem, não sobrevivendo à rebentação emocional que começa por germinar
como um arbusto imparável, descontrolado, expansivo, e que termina por crescer
até o ponto de se converter em árvore e ocupar todo o espaço que lhe é e não
lhe é permitido. Viola Davis: "That was my first mistake: not to make him
leave some room for me".
Um conflito logo se desenha lentamente entre os olhos dos
protagonistas: se os olhos de Washington não choram porque o suor do trabalho
lhe secou as lágrimas, os de Davis vertem indiscriminadamente a água acumulada
ao longo dos anos.
No quintal exíguo dos fundos, não vemos senão um sofá
desgastado, uma bola de beisebol dependurada sobre um galho de árvore,
materiais e ferramentas, um jardim por cuidar. As paredes manchadas da casa não
separam, antes agregam (pensemos nos diálogos que extravasam para outros
espaços). "Some people build fences to keep people out... And other people
build fences to keep people in", diz o personagem de Stephen McKinley
Henderson, o mais sábio entre os sábios que lá pisaram.
Sobre esta casa, um céu em nuvens é rasgado sutilmente pelo
enfraquecido sopro de trompete daquele cujas asas só não vemos porque estão
escondidas por debaixo do terno marrom esfarrapado (e ao final já não há outro
título para Gabe que não anjo caído).
Sim, poderíamos falar sobre o domínio não tão firmado de
Washington na condução dos seus desenlaces narrativos (a resolução das intrigas
extraconjugais, por exemplo). No fundo, poderíamos encontrar problemas de toda
ordem neste filme por vezes irregular. Estes problemas existem, estão lá, mas
diluem-se magnificamente quando, pacientemente, o cineasta desvenda sua função
naquele processo: filmando à altura, respeitosamente, ele encontra o peso e a
medida dos sentimentos verdadeiramente humanos, que hesitam entre a tempestade
e a bonança. Também descobre, naquele cenário reduzido, um mundo de paixões
resignadas, de corpos ressentidos, de fantasmas interiores e de sonhos
malogrados.
Encarar a vida de frente, como Washington encara a morte.
Fences é um filmaço.
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